APRESENTAÇÃO

Textos e silêncios pretende ser um espaço reflexivo ecumênico, fundamentalmente voltado para a vida concreta das pessoas a partir de textos e livros, mas também do caminhar contemplativo e meditativo, da vivência amorosa e solidária dos que, de alguma forma, partilharam comigo suas vidas, dores, sofrimentos e esperanças. A eles - e a vocês - devo a minha vida, o olhar que desenvolvi de existência e a experiência cristã do encontro com o Cristo servidor que nos salva. A eles sou devedor, minha eterna gratidão.

sábado, 15 de outubro de 2011

A força libertadora do belo nas celebrações e práticas sociais


O presente Texto é o resultado de reflexões feitas a partir de aula dada pelo professor Dr. Jung Mo Sung na Paroquia Santos Mártires, situada no Jardim Angela, que fica na periferia da cidade de São Paulo. Pedimos que os méritos que eventualmente tenha este texto seja dado ao Professor, sem o qual não teria sido feito, e os defeitos e inconsistências sejam postos a meu encargo. Este texto não pássou por revisão pelo referido mestre, a quem agradeço.

A força libertadora do belo nas celebrações e práticas sociais 

A teologia da libertação tem um olhar afiado nas questões de desigualdade social, mas pouca preocupação estética.
A hierarquia católica tem uma preocupação de que os estudos teológicos sejam voltados à verdade, sendo que esta está determinada, absoluta e fixa, norteada pelos saberes articulados pela hierarquia. O olhar privilegia, portanto, a ortodoxia.
A teologia da libertação preocupa-se com a ortopráxis, a prática concreta, norteada pela idéia do bem, da ética e da justiça.
O belo, porém, normalmente é um campo estudado pela estética e, ao menos hoje em dia, o importante é parecer bonito. A feiúra e a beleza são conceitos paralelos e interdependentes, onde um depende do outro. O belo, entretanto, tem uma capacidade mobilizadora, tanto pessoal quanto social.
O agir político não é um ‘sair fazendo’ em um processo de luta e tensão, e suas características dependem do tipo de movimento envolvido.
O processo de resistir implica em ativar o instinto e pode implicar em agredir o adversário ou mesmo procurar eliminar o que a ameaça. A pressão leva, muitas vezes, as pessoas que sofrem a agredir e não a se constituir em uma luta de caráter libertadora.
O agir e a força libertadora implicam em uma decisão, que canaliza a direção do agir libertador.
A pessoa, para sair da dimensão de resistência e violência tem de fazer uma caminhada em que sua dignidade vai ganhando corpo e percepção e o senso de responsabilidade – que implica em resposta e resposta transformadora. Não se trata de desenvolver uma culpa ou culpado – que pode implicar na eliminação deste, mas transitar para um paradigma amoroso e integrativo, dialógico e ampliado.
O belo tem, entretanto, a capacidade de ajudar na medida em que canaliza a direção do agir libertador, diminuindo a angústia e a ansiedade, além de permitir a pessoa a desenvolver um olhar diferente assim como novos horizontes, caminhos e possibilidades.
A vida não funciona como está previsto nos livros!
O agir transformador implica em refazer amizades e espaços humanizantes já que ela não existe como ser isolado, mas como ser de relação com os outros. Isolado, usualmente, caminha para a depressão e à patologia. O agir político deve então implicar no resgate da dignidade dos seres atuantes – Gandhi diria que todos os envolvidos na contenda – e a auto-estima.
A dimensão estética envolve o corpo, a natureza, os bens de consumo, assim como o processo de acolher e fazer o outro sentir-se bem, tal como o sorriso pode iluminar os encontros e mostrar aceitação. A estética, sem ética, não realiza a dimensão humana.
No processo de apropriação de si mesmo a pessoa não pode se amar se não percebe os outros lhe amando. A pessoa acaba por se ver com os olhos das pessoas que são importantes para si.
A experiência fundamental da comunidade cristã é a percepção de que Deus Ama e isto é Graça, sem envolver mérito, para todos, portanto. O próprio processo penitencial da confissão é um mérito pelo fato que o pecador / sofredor ser acolhido aceito e transformado a partir de sua realidade histórica e concreta.
O belo pode levar ao outro a percepção a percepção de sua importância, dignidade e sensibilidade, resgatando seu valor.
É costume dizer que Deus é todo poderoso, mas isto não é verdade, ao menos não é isso que aparece no Novo Testamento.
Para o cristão Jesus é a palavra e em Heb. 3 fica claro que o ser de Deus está em Jesus. O evangelho é, pois, o livro que fala a Palavra que é Jesus, expressando a verdadeira face Dele que é Amor.
A identificação de Deus com o Poder, que pode impor sua vontade implica em uma idolatria. A força de Deus, outrossim, é algo diverso, pois permite movimento... O amor não se obriga, mas me escolhe e pressupõe a liberdade. Uma liberdade tão radical que independe de resultados e de sucesso já que persiste na dificuldade e no fracasso. O processo de poder implica em obrigação, em obediência, mas não em conversão, nem em atitudes mais amorosas nem humanizantes.
A Igreja, em Pentecostes, mostra que sua força, emanada da experiência salvífica, produz coragem para falar que o Templo está errado e que Jesus ressuscitou.
A experiência do belo fortalece a força e a beleza de um sorriso de criança revela o bem que expressa a verdade.
Numa sociedade capitalista a plástica acaba por criar pessoas incapazes de expressar emoções!
Já os deficientes são escondidos e excluídos pela sociedade para ficarem invisíveis, pois mostram a vulnerabilidade das pessoas, da sociedade e de suas estruturas infames.
A experiência do belo pode ir se acumulando e produzir a sensação de vazio, simplicidade de cuidado para o outro, carregando por si um enorme simbolismo, inclusive libertador, pois aponta para a valorização do ambiente e das pessoas a que dirige.
O que ocorre no dia a dia de nossa sociedade é algo bastante diverso já que você é valorizado pelo que pode produzir ou acrescentar ao mercado, o que traz conseqüências inevitáveis para os que não podem aprender ou gerar valor. A pessoa excluída e agredida mais e mais acaba por se agredir ou agredir a outras pessoas. O capitalismo sobrevaloriza a utilidade e a produção.
O projeto de Deus, expresso em Gêneses no Jardim do Edem, mostra uma criação com frutos gostosos e belos de se ver!
Nossa vida concreta, entretanto, cheia de limitações e opressões é diversa, presa a conceitos desumanizantes e a violência em relações que se fundam na busca incessante de ser útil (e serem valorizados por isso), sem experiências de gratuidade e vivências amorosas. A vida humana, porém, é cheia de oportunidades para experiências de outra dimensão, da gratuidade, do amor e da entrega, da Graça que revela Deus ao mundo.
Todos, em algum momento da vida, temos a experiência de fundo, um sofrimento que é diferente para cada pessoa e assim deve ser acolhido e enfrentado. A saída deste processo implica em retomar a força que vem do Amor a si, que brota do Amor vivido na relação concreta com o outro, que procede de Deus. Deus amor e serviço se revela e depende, muitas vezes, da forma como a comunidade cristã expressa sua vitalidade e seu serviço, para permitir a percepção do sentir-se amado. Muitas e muitos têm hoje, mesmo na Igreja, a experiência de ser valorizado apenas se pessoa de sucesso, bela e rica e quantos não têm a singeleza do amor familiar e fraterno, base de nossa humanidade.
A dimensão do belo tem por característica aumentar a sensibilidade humana, a pertença e o vínculo com outro e a percepção do Amor a si dirigido.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

NOSSO PAIS VIROU UMA POCILGA!!!!!!!!


Faço minhas as palavras abaixo....
Precisamos nos movimentar mais, reclamar menos, exigir mais - inclusive de nós mesmos!
Nosso país virou uma pocilga
José Lisboa Moreira de Oliveira
Filósofo, teólogo, escritor e professor universitário
O dia 30 de agosto de 2011 vai ficar marcado na história do nosso país como a data na qual o
Brasil, de modo definitivo, virou uma pocilga. De fato, neste dia, 265 deputados federais absolveram
a colega Jacqueline Roriz, considerando normal o fato de que ela tenha se beneficiado do
propinoduto do Mensalão do DEM, liderado pelo ex-governador de Brasília, José Roberto Arruda.
Mesmo a deputada tendo admitido publicamente que recebeu a propina, seus pares a inocentaram
pelo simples fato de que ela não cometeu o crime na atual legislatura. Como se não bastasse os
últimos casos de corrupção na esfera pública, as pessoas honestas deste país foram obrigadas a
respirar mais este mau cheiro insuportável de corrupção que permanece impune.
Meu pai, hoje com 82 anos, só teve a oportunidade de estudar até a terceira série do ensino
fundamental. Porém, frequentou a universidade da vida e, por meio dela, se tornou pós-doutor em
vivências e em experiências. Como “professor de vida” nos ensinou muitas lições. Uma delas, que ele
ama repetir até hoje, soa assim: “Quem faz um cesto, faz um cento”. Ou seja, o corrupto que fez uma
coisa errada uma vez, o fará sempre. Além disso, ao absolverem a colega corrupta, os 265 deputados
do nosso parlamento admitiram estar com “o rabo preso”. Fica-nos a impressão de que também eles
devem ter participado ou têm intenção de participar de atos de corrupção como este e, por isso, não
se sentiram livres para punir uma colega flagrada “com a mão na botija”. Com isso assinaram o
próprio diploma de corruptos, que deveriam colocar em uma moldura chique e pendurá-lo na porta
de entrada de seus gabinetes.
Mais uma vez ficou evidente a urgência da ética em nossa sociedade brasileira. Por ética
entendemos a forma de ser no mundo por meio da qual o sujeito concreto se sente comprometido
com a dignidade do ser humano e com a justiça social. Leonardo Boff define a ética como sendo tudo
aquilo que ajuda a tornar melhor o ambiente em que vivemos para que seja uma moradia saudável.
Assim sendo, a ética não é outra coisa senão cuidar para que a Terra seja sempre uma morada
saudável. É cuidar das pessoas de modo que elas, sentindo-se bem, possam, de fato, comprometerse
com a felicidade das demais. Portanto, cuidado e ética são sinônimos.
Hoje se fala demais de ética. Porém, isso não é o bastante. É indispensável que se desenvolva
uma prática que torne eticamente correto o comportamento moral das pessoas em sociedade. Diante
de fatos estarrecedores como este, ficamos escandalizados e decepcionados. Mas seria necessário
admitirmos, com toda sinceridade e honestidade, que a corrupção está impregnada na cultura e na
cabeça de todos nós. Estes 265 deputados que absolveram a colega corrupta não chegaram ao
parlamento por acaso. Não tomaram o poder à força. Foram eleitos por brasileiros e por brasileiras.
Logo, mais da metade dos eleitores de nosso país é formada de corruptos que elegem corruptos.
Aliás, não é difícil constatar como a corrupção está semeada entre nós. É bem conhecido o
nosso “jeitinho brasileiro” de resolver os problemas. Estamos acostumados a práticas como “pagar
por fora, pagar uma cerveja, pagar um guaraná, dar uma gorjeta” etc. Há o funcionário que
massacra o colega, o estudante que copia e cola, o funcionário público que assina o ponto digital e
some do seu local de trabalho, o professor que faz de conta que dá aula, o garoto riquinho que é
flagrado cometendo delito e liga para o pai dele pedindo que fale com o policial etc. etc. Reclamamos
da corrupção dos políticos, mas, infelizmente, a “cultura da corrupção” está embutida em nossas
cabeças. E quando é para “levar vantagem em tudo”, não hesitamos em lançar mão das formas mais
simples e comuns de corrupção, como, por exemplo, furar a fila no banco, mesmo que
disfarçadamente.
Falta-nos a coragem de parar para refletir sobre essas coisas; falta-nos sensibilidade e
racionalidade para entendermos que o corrupto não chega sozinho à esfera pública. Ele é levado por
eleitores, por boa parte daqueles mesmos que, hipocritamente, ficam escandalizados quando
escutam o noticiário sobre a corrupção.
Mas para que possamos mudar esta situação é indispensável que não confundamos ética com
moral. Esta última compreende normas, regras de ação e fatos a ela relacionados. A moral seria um
conjunto de princípios e de prescrições que as pessoas de um determinado grupo humano
consideram válidos, bem como os atos reais deles decorrentes. A moral é normalmente determinada
a partir da cultura, da filosofia e da ideologia dominante. Na moral as pessoas se atêm às normas
fixas que lhes possam assegurar que elas não estão erradas. Porém, na ética as pessoas escolhem o
que fazer não a partir do que “não está errado”, mas a partir da consciência de justiça e de dignidade
humana que possuem. Bauman, filósofo e sociólogo polonês radicado na Inglaterra, defende que,
em muitos casos, precisamos transgredir as normas da moral para fazer prevalecer a ética. Isso
porque nem sempre o que é moral é o melhor para seres humanos reais. Às vezes a ética precisa ser
“imoral”.
No caso da absolvição da deputada, seus colegas entenderam que tal ato não era “imoral”,
uma vez que ela não tinha recebido a propina na atual legislatura. Ao fazerem isso os deputados
seguiram a moral e ofenderam a ética. O fato deixou também evidente que os eleitores desses
deputados são moralistas. Eles se escandalizam com a corrupção e se decepcionam com a política,
mas na hora de votar, não pensam no bem comum, não usam a razão. Do contrário não teriam
votado nesses 265 deputados que absolveram uma colega que confessou publicamente a prática de
um ato de corrupção.
Nosso país virou uma pocilga. Sente-se o mau cheiro por toda parte. E não adianta fazer
protestos em frente ao Congresso Nacional, lavando o chão e as rampas. Precisamos lavar as nossas
consciências, pois o fedor que sentimos não vem só de Brasília, vem de dentro de nós mesmos, de
nossas cabeças corruptas. Somos um povo de maioria corrupta, que vota em corruptos. É duro dizer
isso a nós mesmos, mas, enquanto não tivermos a coragem de fazer isso, a corrupção não terá fim.
Meu velho pai, pós-doutorado em vida, sempre nos ensinou que “quem se mistura com porcos,
farelos come”. Se no atual momento o Brasil exala este fedor de pocilga é porque a maioria dos
brasileiros está “comendo farelo”, votando em “porcos” que adoram enlamear-se na corrupção.
Se quisermos ser éticos, e contribuirmos para que exista ética no Brasil, devemos estar
preparados para transgredir certo tipo de moral, fazendo prevalecer a ética. Melhor dizendo,
precisamos ter a coragem de lutar e de nos comportarmos de forma tal que as nossas normas morais
coincidam com a ética.
Ainda resta o apelo ao Judiciário. Mas será que este poder também não vai trocar a ética pela
moral, como fizeram recentemente com a chamada Lei da Ficha Limpa? Não foram estes nobres
magistrados que permitiram que políticos comprovadamente corruptos, eleitos no último pleito,
voltassem ao Congresso só porque não cometeram seus delitos na atual legislatura?
Vale a pena chamar em causa o meu conterrâneo Ruy Barbosa que quase cem anos atrás, em
1914, assim falava aos seus pares: "A falta de justiça, Senhores Senadores, é o grande mal da nossa
terra, o mal dos males, a origem de todas as nossas infelicidades, a fonte de todo nosso descrédito,
é a miséria suprema desta pobre nação. A sua grande vergonha diante do estrangeiro, é aquilo
que nos afasta os homens, os auxílios, os capitais. A injustiça, Senhores, desanima o trabalho, a
honestidade, o bem; cresta em flor os espíritos dos moços, semeia no coração das gerações que
vêm nascendo a semente da podridão, habitua os homens a não acreditar senão na estrela, na
fortuna, no acaso, na loteria da sorte, promove a desonestidade, promove a venalidade, promove
a relaxação, insufla a cortesania, a baixeza, sob todas as suas formas. De tanto ver triunfar as
nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver
agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se
da honra, a ter vergonha de ser honesto”.
Ou, talvez, quem sabe, convidemos Aristóteles para que depois de vinte e quatro séculos
volte e grite em nossas praças: “O mal prevalece quando os bons se calam”. Lembrando que para o
filósofo grego bom é aquele que ama a ética, no sentido antes explicado.