APRESENTAÇÃO

Textos e silêncios pretende ser um espaço reflexivo ecumênico, fundamentalmente voltado para a vida concreta das pessoas a partir de textos e livros, mas também do caminhar contemplativo e meditativo, da vivência amorosa e solidária dos que, de alguma forma, partilharam comigo suas vidas, dores, sofrimentos e esperanças. A eles - e a vocês - devo a minha vida, o olhar que desenvolvi de existência e a experiência cristã do encontro com o Cristo servidor que nos salva. A eles sou devedor, minha eterna gratidão.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

nova evangelização


CEBI

A nova evangelização e os novos profetas da desgraça - Enzo Bianchi

Terça-feira, 21 de agosto de 2012 - 13h24min
Nas últimas décadas, caíram as ideologias portadoras de uma esperança messiânica intra-humana, fracassou a transmissão da fé cristã pela geração que está desaparecendo às novas gerações que se assomam ao horizonte, tornou-se muito fraco o anúncio do evangelho como boa notícia aqui e hoje.

A reflexão é do monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, prior e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado na revista Jesus, de agosto de 2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Já está próxima a celebração do Sínodo dos Bispos que irá refletir sobre o tema da evangelização de modo a poder dar indicações à Igreja universal, indicações que depois deverão ser concretizadas, traduzidas e realizadas de modo diferenciados e específico nas diversas áreas culturais do mundo. No entanto, continua sendo verdade que esse tema, quando é anunciado como "nova evangelização", diz respeito sobretudo ao Ocidente europeu e norte-americano, as terras de mais ou menos antiga cristianização, terras em que se viveu um sólida pertencimento às Igrejas cristãs, mas que hoje - depois do fenômeno da secularização e do desencanto religioso - estão contaminadas pelo indiferentismo.

Nas últimas décadas, caíram as ideologias portadoras de uma esperança messiânica intra-humana, fracassou a transmissão da fé cristã pela geração que está desaparecendo às novas gerações que se assomam ao horizonte, tornou-se muito fraco o anúncio do evangelho como boa notícia aqui e hoje.

Eis, portanto, a urgência de repensar as palavras de Jesus, que enviava os seus discípulos em missão no mundo inteiro (cf. Mc 16, 15), até as extremidades da terra (cf. Atos 1, 8), entre todos os povos e até o fim dos tempos (cf. Mt 28, 19-20). Isso na convicção de que o nosso tempo, a contemporaneidade - o único tempo que conhecemos ao viver imersos neles - é sempre um "momento favorável" para o anúncio da boa notícia de Jesus Cristo, o único Filho de Deus e o autêntico homem.

No tempo oportuno ou não oportuno (eúkairos - Ákairos, cf. 2Tm 4, 2), se há em nós uma humanização que ocorre na sinergia entre a graça do Senhor - isto é, o Espírito Santo - e o nosso espírito, então nós devemos testemunhá-lo, anunciá-lo a quem nos pede conta do nosso modo de viver, dessa esperança que nos habita (cf. 1Pd 3, 15), dessa prática do amor que Jesus nos pede para viver cotidianamente.

Então, é inútil procurar estratégias ou táticas de nova evangelização, é pernicioso ter medo da nossa fraqueza devida a uma diminutio numérica, mas não de significado, é mundano esperar em um retorno da cristandade tranquilizante dos tempos passados.

Mas então o que devemos procurar, como devemos nos mover nesse êxodo de uma terra que deixamos para trás para nos dirigir rumo a uma margem que não conhecemos, mas que sabemos que é um horizonte habitado pela potência de Jesus ressuscitado e vivo, à espera do nosso desembarque para iniciar um outro êxodo, para passar de êxodo em êxodo até o reino?

Acredito que, acima de tudo, devemos mudar a nossa atitude para com a humanidade em que estamos imersos e da qual fazemos parte: uma humanidade não mais cristã, mas que devemos ouvir nas suas manifestações mais impressionantes e nos seus gemidos. Como Igreja, devemos nos exercer a uma leitura sábia da história, sem ceder à tentação de assumir posições defensivas, de encastelar-nos em cidadelas que forçosamente contam com o número e com os recintos: é fácil ceder a essa falta de fé no Senhor da história, o Senhor amante dos seres humanos, o Senhor, que "quer que todos os seres humanos sejam salvos" (1Tm 2, 4), e se tornar profetas da desgraça, como advertia João XXIII há 50 anos atrás, no início do Concílio.

Devemos ouvir para aprender, na consciência da autonomia da história e na liberdade da humanidade que, no entanto, continua sendo querida por Deus, composta por pessoas cada uma "criada à imagem de Deus" (cf. Gn 1, 26): esse selo impresso por Deus em cada ser humano, justo ou pecador, nunca poderá falhar. Trata-se também de não alimentar ingenuidade, de não ser desprovido de humanidade, mas capaz de discernir a presença do mal reconhecendo, porém, o caminho de humanização e de autocorreção do qual o ser humano é capaz, como nos recorda Christoph Theobald.

É nesse espaço em que a Igreja encontra o mundo na escuta e no diálogo recíproco que os cristãos munidos de uma fé madura, exercitada, pensada, dizem e vivem o evangelho, acima de tudo como escola de humanidade, caminho de humanização: cristãos que sabem despertar confiança naqueles que encontram, naqueles dos quais se fazem próximos; cristãos que sabem discernir nos outros a fé humana que os habita e aos quais podem doar palavras, atitudes e ações que narram Jesus de Nazaré.

A crise de fé hoje, antes de ser crise de fé em Deus, é uma crise de confiança humana, é a falta de confiança nos outros, na vida, no futuro e, acima de tudo, é fraqueza em acreditar no amor (cf. 1Jo 4, 16). Apenas em um terreno tão humanizado e predisposto, Deus pode então realizar o que só Ele é capaz de operar: doar a fé, isto é, iniciar uma relação com quem ouve a sua palavra, que quem encontra Jesus Cristo, porque "a fé nasce da escuta" (fides ex auditu: Rm 10, 17).

Então, a Igreja encontrará em seu limiar aqueles que desejam e pedem para ser introduzidos em Jesus Cristo, que pedem para se tornar o seu corpo através do batismo e da eucaristia... Assim ocorre a geração em Cristo e na Igreja, assim a evangelização se torna evento de encontro, de relação viva entre Deus e o ser humano: no tecido de relações humanas cotidianas entre cristão testemunha evangelizador e o ser humano de hoje. A evangelização, de fato, sempre depende do testemunho pessoal de quem evangeliza: o evangelho, a boa notícia só acontece no encontro, na relação com uma pessoa.

Os homens e as mulheres de hoje continuam perguntando: "como viver?". Nós não lhes respondemos procurando novos métodos mais refinados, não respondemos com a expectativa de um percurso fácil: tentamos apenas viver a fé e, portanto, despertar confiança, sem ter medo, porque o Senhor está conosco, e quanto mais nos sentimos fracos, mais opera em nós a sua força (2Cor 12, 10).
Instituto Humanitas Unisinos (IHU)

CEBI - Centro de Estudos Bíblicos
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