APRESENTAÇÃO

Textos e silêncios pretende ser um espaço reflexivo ecumênico, fundamentalmente voltado para a vida concreta das pessoas a partir de textos e livros, mas também do caminhar contemplativo e meditativo, da vivência amorosa e solidária dos que, de alguma forma, partilharam comigo suas vidas, dores, sofrimentos e esperanças. A eles - e a vocês - devo a minha vida, o olhar que desenvolvi de existência e a experiência cristã do encontro com o Cristo servidor que nos salva. A eles sou devedor, minha eterna gratidão.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Diálogo interreligioso


Abramos nossos corações para o diferente que é abertura para o novo, para que nossa humanidade apenas possa crescer, sem medos, sem inseguranças....

CEBI

Deixemos que o outro nos diga quem ele é

Terça-feira, 10 de julho de 2012 - 10h05min
Especialista em budismo e em diálogo inter-religioso, Dennis Gira transmite no seu último livro (Le Dialogue à la portée de tous... ou presque, Ed. Bayard) a experiência de mais de 40 anos de compromisso com uma grande variedade de diálogos.
Eis a entrevista.

Por que você escreveu agora este livro sobre a arte do diálogo?


Certamente, eu não poderia escrevê-lo antes! Ele deriva de uma longa experiência de diálogo inter-religioso, ecumênico, mas também intercultural. Aprendi como dialogar in loco, pouco a pouco, há mais de 40 anos - dos quais oito no Japão e o restante na França.
Nesse livro, eu quis apresentar o que, na maior parte do tempo, eu não tive tempo de explicar nas minhas palestras ou conferências: como se pode construir um diálogo real, o que favorece o encontro, o que o coloca em perigo ou o torna impossível . Muitas vezes, a urgência do diálogo faz com que não se reflita sobre o próprio ato de dialogar.

Em quem você pensava ao escrevê-lo?

Eu tinha em mente meus ex-estudantes e inúmeras pessoas engajadas no diálogo inter-religioso e intercultural, que me expressaram seu desejo de aprender a como dialogar. Eu escrevi esse livro para o público mais amplo possível. Eu queria que ele pudesse ser utilizado por um budista, assim como por um cristão, no diálogo inter-religioso como também no diálogo intercultural, por casais... Afinal, são as mesmas questões que são feitas e as mesmas atenções que permitem nos tornarmos um "ser de diálogo".

Você dedica um longo espaço para definir o diálogo. Isso se deve ao fato de que muitas vezes há equívocos sobre esse assunto?

Sim, e eu acho que essa é uma das razões pelas quais alguns crentes se desencorajam diante do diálogo inter-religioso. Às vezes eu ouço dizer: "Como dialogar quando tantas diferenças nos separam?". Esse é para mim um sinal evidente de que muitas vezes nos equivocamos sobre o que é o diálogo. Confundimo-lo com uma negociação, que visa a chegar a uma forma de consenso. Ao contrário, o diálogo não se assusta com as diferenças, porque ele não visa a um acordo que precisaria de compromissos.
Além disso, sobre o que e em nome de que um cristão, um budista, um muçulmano ou um hindu pode se sentir autorizado a fazer compromissos? Ao invés, graças ao diálogo, os fiéis podem chegar a uma melhor compreensão da sua história, da sua cultura, e descobrir o seu interlocutor. Outras confusões são frequentes: fazer do diálogo um debate, onde há um vencedor e um perdedor, ou ainda uma simples conversa, que engaja muito menos do que um diálogo.

Para você, o diálogo precisa de uma ascese. Em que sentido você emprega essa palavra?

A ascese não tem nada a ver com a penitência, a mortificação ou com com um desprezo qualquer pelo corpo. Com essa palavra, eu quero assinalar que o diálogo exige um estilo, um modo de ser, que é uma atenção aos outros e a si mesmo. Trata-se de cultivar certas disposições, que eu chamo de os cinco "amigos" do diálogo: o respeito, a amizade, a humildade, a paciência e a escuta. A ascese não reside em exercícios complexos, que se afastam da vida comum. Ela está em jamais se esquecer que a verdade em que eu acredito possuir é sempre menor do que a verdade em si mesma. Parece simples, mas exige uma grande vigilância.

Depois de mais de 40 anos de experiência em diálogos múltiplos, qual lhe parece ser o maior obstáculo para o encontro?

O medo, porque ele faz construir fortalezas. Quando eu era estudante, eu tive a chance de ter um professor jesuíta, que me deu um conselho que me permitiu viver sempre positivamente junto com pessoas que tinham formas de pensar, de viver, de crer (ou de não crer) que as minhas. Ele simplesmente me disse que um cristão não tem o direito de temer a diferença, apesar das questões, perturbadoras às vezes, que essa diferença pode levantar para ele. Um cristão, explicou-nos, é chamado a ir cada vez mais longe em sua busca pela verdade. Em contraste, aquele que acredita possuir a verdade fere a si mesmo. Ele se encontra prisioneiro em muros que ele edificou. Identificar o que eu entendo por Cristo com a verdade de Cristo é tornar-se incapaz de avançar no caminho espiritual.

Você também adverte contra um certo saber, que é mais inesperado...

Sim, porque esse é um perigo real, muitas vezes subestimado. Eu entendo por saber aquele "eu sei do que estou falando", às vezes inconsciente, que torna impossível muitos diálogos. Muitas vezes, nós acreditamos saber quem é outro e, quando ele fala, não levamos em conta a sua palavra. Ao invés disso, cabe ao outro dizer-nos quem ele é. Entrar em diálogo supõe estar disposto a ser surpreendido pelo seu interlocutor. Devemos também desconfiar daquilo que acreditamos saber sobre a nossa tradição...

Que conselhos você daria para quem deseja entrar em um diálogo?

O primeiro é não buscar nos outros o que é importante para nós. Muitas vezes, eu dou o exemplo dos meus amigos norte-americanos que, quando visitaram o Japão e entraram na casa de um dos meus amigos japoneses, ficaram procurando pela mesa alta. Mas em uma casa japonesa essa mesa está ausente... É uma regra de ouro: não procure pela mesa em uma casa japonesa! Não busque nos outros o que é importante para você, senão você não nunca descobrirá o que é importante para eles. Quem quer dialogar também deve reconhecer os limites da linguagem, apesar do uso de palavras comuns, e julgar a tradição do outro pelos seus "ápices" e não pelos seus "subprodutos".
A reportagem é de Élodie Maurot, publicada no jornal La Croix, 06-07-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
CEBI - Centro de Estudos Bíblicos
www.cebi.org.br 

Nenhum comentário: