APRESENTAÇÃO

Textos e silêncios pretende ser um espaço reflexivo ecumênico, fundamentalmente voltado para a vida concreta das pessoas a partir de textos e livros, mas também do caminhar contemplativo e meditativo, da vivência amorosa e solidária dos que, de alguma forma, partilharam comigo suas vidas, dores, sofrimentos e esperanças. A eles - e a vocês - devo a minha vida, o olhar que desenvolvi de existência e a experiência cristã do encontro com o Cristo servidor que nos salva. A eles sou devedor, minha eterna gratidão.

sábado, 9 de junho de 2012

ONDE ESTÁS?


Gênesis 3, 8-21     2Corintios 4, 13-18    Marcos 3, 20-35



Queridos irmãos, queridas irmãs,

Amados e amadas de Deus,

Estamos diante de uma imagem, uma bela imagem, de um jardim idílico, belo, perfeito. Lá estão o homem e a mulher e Deus lhes fala: Onde estás? E o homem estava escondido e nu, pois tivera a consciência de sua nudez, de seu corpo e, também, de sua fragilidade. A vergonha perante Deus parece apontar para a perda da intimidade entre si e com o próprio criador.

O escritor aponta este distanciamento como a causa da hostilidade entre o homem e a mulher, da dominação masculina sobre a mulher ( que revela um olhar machista opressor) e olha para a realidade que enxerga – bem concretamente – na sua vida. A mulher dá a luz com dor a sobrevivência é difícil e o homem tem de trabalhar duramente, até a morte, até pó tornastes...

Tu és pó e ao pó tornarás!

Aparentemente, pela mentalidade da época, toda a realidade visível era de responsabilidade de Deus, como prêmio ou castigo de Deus a nossos atos, mas é o homem que rompe com a intimidade com Ele, é ele que não assume a beleza, com a inteireza de seu corpo e de relações íntimas e saudáveis.

Deus segue a nos perguntar: Onde estás? Estamos, conscientemente, com Deus em nosso coração, em nossos passos, em nossos olhares? Damos graças a este acontecimento presente amorosamente em todos os nossos encontros salvíficos? Encontros de presença amorosa numa sociedade fragmentada, dividida, consumista e agitada, onde estamos costumeiramente mergulhado na exterioridade, no corre corre. Não temos tempo, costumeiramente, para usufruir, desinteressadamente, da presença e dos olhares do cônjuge, dos filhos, dos amigos, do brincar. Não tempo tempo, e muitas vezes sequer temos a experiência concreta da oração, da escuta do que Deus nos pede para nossa vida, experiência que precisa de interioridade, de silêncio, de contemplação para, quem sabe, posteriormente, tornar-se resposta em atos ou palavras salvíficas, em entrega eucarística, em vida cristã.

Imobilizamo-nos inertes em frente da televisão ou da internet ou a trabalhar, trabalhar, trabalhar, para acumular o vil metal, o dinheiro – Senhor de nosso tempo e de nossos corações – para viabilizar o consumo, o comprar, o luxo, o prazer. Até... virar pó! Viramos pó, infelizmente em vida, nos coisificando, anulando a experiência e a possibilidade de Deus existir e viver em nossa vida, em nossos braços, em nossos olhares, em nossa entrega. Tornamo-nos em um nada, em objeto sugado pelo mercado, vazios de significado e sentido...

No Evangelho de hoje jesus é visto, até pelos seus, como um louco. Louco! E quem é o louco? Aquele que não age em conformidade com o senso comum, que aporta novos olhares, perspectivas e possibilidades. É claro que pode ser um olhar doentio, psicótico e desequilibrado. Neste caso, porém, ele era assim visto porque questionou um modo de ser, de relacionar-se com os outros, com a família, com a religião e a lei judaica e, certamente, com o Império.

Fala Jesus, e nós já o afirmamos qui, que Satanás é aquele que divide a comunidade, espaço de vida, fraternidade, de partilha,do pão e também dos bens.

Perdoar os pecados, naquele tempo, era privilégio do Templo e de seus sacerdotes. Aristocráticos  que cobravam nos rituais de purificação. Jesus faz constantemente o movimento de ir às casas das pessoas, à sua intimidade para lá revelar a salvação,a cura de doentes e endemoniados. É este o lugar da revelação do Espírito Santo, no centro da vida e da comunidade, que Marcos está vendo diante de si. É aí que podemos nos corrigir fraternalmente, nos converter dia a dia e todo dia e é aí que podemos aprender a ouvir a Palavra de Deus, a amar Sua presença, a sentir Seu toque, Seu sopro, Seu alento, Seu olhar. E quem negar a comunidade, a igreja, o encontro, tão comum hoje em dia – quando tantos acham que possuem o Espírito Santo sozinhos ou mesmo que podem prescindir da igreja como espaço salvífico,que podem ter a experiência com Ele estando sozinhos – está mergulhado no espírito impuro!

É por isso, pela importância da vida em comum, local da intimidade e do encontro com Deus, que Jesus aponta que aqueles que a seu lado estão são sua família, sua mãe. E esta multidão, veja bem não foi escolhida por ele e, certamente, não era formada por poderosos, privilegiados, ricos, mas dos desvalidos em busca de alento.

Em 2Corintios, 7 está escrito: Trazemos, porém, este tesouro em vasos de argila, para que esse incomparável poder seja de Deus, e não de nós.

É a realidade da igreja nascente: é de atribulados, postos em extrema dificuldade, perseguidos mas não abandonados, prostrados por terra mas não aniquilados. A vida de Jesus manifestada em nosso corpo! Em vasos de argila, artesanais e frágeis, em nós. Não somos nós que agimos mas, em nossa fraqueza e pequenez que nossos atos podem se tornar na Graça de Deus, na Sua presença. Agimos mas em nosso agir é Ele quem se faz presente, é dele a glória, a graça, a força,os frutos.

Acreditei, por isso falei.

Acreditei não dogmaticamente nem cegamente, mas pela fé que advém do testemunho do amor, da unidade e do serviço mútuo, da luta pela justiça, pelos Direitos Humanos, da humanidade radicalizada em um deus que se encarnou no meio de nós. E que segue presente na Eucaristia e no Santo Espírito que sopra no meio de nós.

A certeza da ressurreição, de Cristo e a nossa, é o fundamento de nossa vida cristã. A experimentação de sua presença, a experiencia concreta de  Deus e de seu testemunho em nossa carne e em nossa mente é a loucura sadia que temos a oferecer a este mundo insano.

Onde estás?

Ma presença do Deus amoroso – não o do julgamento, respirando amor e acolhimento, no meio dos que sofrem e dos que tem a vida ameaçada, a revelar o Evangelho, a Boa notícia.
Deus aqui está! Deus conosco – Emanuel. Jesus, o Cristo, o Senhor da vida contra as forças da morte.

Permaneçamos na Presença de Deus, revelando Seu olhar e toque amoroso, pela eternidade.

Amém!

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